Quantas fases compõem uma venda?
Meus leitores sempre me enviam interessantes sugestões de pauta. Em uma delas é pedido que eu descreva
Meus leitores sempre me enviam interessantes sugestões de pauta. Em uma delas é pedido que eu descreva “a rotina completa de uma venda (ou mais) mostrando todos os trâmites e a documentação necessária, mostrando impostos, descontos, frete, comissões etc. Isso é um básico difícil de encontrar nos livros e na Internet”.
Em primeiro lugar é preciso lembrar que há vários tipos de venda: varejo, atacado, industrial (que se divide em venda para consumo e para transformação), venda pessoal, de serviços e outras modalidades.
Vejamos primeiro a questão da definição do preço pelo qual venderemos nossos produtos ou serviços. Na indústria esse cálculo considera os custos dos insumos, das matérias-primas, do processo de transformação – que inclui o overhead, os custos financeiros, impostos e a margem de lucro do fabricante. Também se levará em consideração se o produto será vendido CIF (ou seja, os custos de transporte serão pagos pelo vendedor) ou FOB (situação em que o comprador arcará com os custos do transporte. Já os canais de distribuição de bens tangíveis (atacado ou varejo) não tem custo de produção. Neste caso, o preço final dos produtos deverá ser calculado levando em consideração o custo de aquisição da mercadoria, custos operacionais e financeiros e margem de lucro pretendida (arbitrada em função de um conjunto de fatores, tais como giro médio, preço praticado pela concorrência, posicionamento do produto).
Já na venda de serviços, normalmente, calcula-se o custo total do serviço (somando todos os custos fixos e variáveis) e se estima um overhead (que imbute custos indiretos que deverão ser pagos pelas operações comerciais – o salário da diretoria, por exemplo). A partir dessa base, acrescentam-se os impostos diretos (PIS, CONFINS, CSSL, ISS, IR entre outros possíveis). O valor de cada alíquota dependerá do regime de lucros (real ou presumido), do quanto cada município cobra de ISS (legalmente esse valor pode variar de 2 a 5 %, mas há municípios que cobram menos) e mesmo do faturamento trimestral da empresa.
Como se pode ver, a romântica idéia de que preço é a soma de todos os custos adicionada de uma margem de lucro pretendida é bonita, mas foge totalmente da realidade dos fatos.
De posse da tabela de preços (que normalmente foi “engordada” artificialmente para permitir uma certa “flexibilidade nas negociações”), o vendedor parte para campo. Nesse trabalho, poderá estar: (a) levantando leads; (b) qualificando prospects; (c) atendendo clientes.
Se está levantando leads, o vendedor deverá ter a postura de um verdadeiro caçador e o faro apurado de um felino. Não há mais setores pouco concorridos e a disputa por qualquer possível novo cliente é sempre desafiadora.
Se o possível novo cliente já foi identificado, é preciso qualificá-lo. Isto significa verificar se suas características sócio-economico-demográfica-psicográficas estão de acordo com o posicionamento do produto. Do que adianta vender uma BMW para uma pessoa sem condições financeiras e que, certamente, vai nos dar mais dores de cabeça do que alegrias pois não terá condições de manter o carro condignamente?
Qualificado o prospect, agora é hora de convencê-lo a comprar o nosso produto em detrimento daqueles que são oferecidos pela concorrência. Aqui, o vendedor vai utilizar toda a sua capacidade de influência e negociação para convencer o cliente que sua oferta é melhor do que a do concorrente. Expedientes como descontos, promoções, vantagens e reciprocidades serão largamente utilizados pelo vendedor experiente, mas sempre sem abrir mão da ética e da transparência.
Supondo ter sido bem-sucedido, advém o momento mágico da obtenção do pedido (ou aceite, pois muitas vezes o pedido é verbal e não por escrito). Alguns dirão que a venda acabou aí. Discordo radicalmente. Acredito que aí é que começou a fase mais complexa e desafiadora das vendas: entregar o que foi prometido.
Talvez o pós-venda seja uma fase ainda mais difícil do que a venda. Em todos os meus seminários e palestras faço aos participantes a seguinte pergunta: o que é mais difícil, vender para dentro ou vender para fora? Nos últimos quinze anos, jamais encontrei um vendedor que dissesse que é mais difícil convencer o cliente externo a comprar do que convencer as pessoas da própria empresa a entregar o que foi vendido.
Por que? Creio que a maioria das empresas brasileiras – e as estrangeiras também – precisam resignificar o papel dos gestores da área comercial. O termo resignificar foi usado por um psicólogo famoso (Lacan) que dizia que precisamos compreender nossa própria história levando em consideração o momento em que as coisas ocorreram. Minha experiência tem mostrado que a maioria dos gestores de área comercial ainda não fizeram isso, por medo de serem acusados de ter errado no passado.
Para dar um exemplo do que quero dizer, antigamente era comum que o gerente de vendas atendesse a diversas contas, chamadas de contas-chave. Hoje a maioria das empresas tem uma equipe de profissionais treinados para atender a clientes diferenciados, os chamados key-accounts. Assim sendo, é apenas uma duplicação de esforços colocar gerentes de equipe para atender diretamente clientes.
O verdadeiro papel de um líder de equipe é facilitar que o que foi vendido seja entregue. Os nossos gerentes deveriam dividir seu tempo em duas metades equivalentes. Na primeira eles estariam no campo, orientando suas equipes e agindo como verdadeiros treinadores (ou coachers, como se diz modernamente). A outra metade deveria ser dedicada a resolver problemas que ocorrem comumente nas áreas de produção, logística, financeira ou mesmo junto aos canais. Assim se completaria o ciclo da venda de forma harmoniosa. Os vendedores dariam o melhor de si para mostrar como suas ofertas podem ajudar os clientes, e os gerentes garantiriam que aquilo que foi vendido corresponde exatamente ao que está sendo entregue.
Pense nisso e boas vendas.
JB Vilhena é coordenador acadêmico do MBA em Gestão Comercial da IBE Conveniada FGV